"Mas quanto tempo um homem pode ficar relembrando os melhores momentos da meninice? Por que não desfrutar os melhores momentos da velhice? Ou seria o melhor da velhice justamente isto - relembrar com saudade o melhor da meninice, aquele rebento tubular que era seu corpo, que acompanhava as ondas desde lá de longe, onde elas começavam a se formar, vinha carregado por elas com os braços voltados para a frente, como se fossem a ponta de uma seta e o resto do corpo magricela vindo atrás fosse a haste da seta, até o momento em que seu peito roçava contra as pedras e conchas ásperas do fundo, e ele se punha em pé e mais que depressa dava meia volta e seguia em direção ao fundo até que a água estivesse à altura de seus joelhos, funda o bastante para ele mergulhar e começar a nadar loucamente em direção ao fundo, até o ponto em que as ondas se formavam - penetrando o Atlântico verde, que avançava inexorável como a realidade obstinada do futuro - e, quando tinha sorte, chegava lá no momento exato para pegar a próxima onda grande, e depois a próxima, e a próxima, e a próxima, até que, quando o sol ficava tão baixo que seus raios já roçavam a superfície do mar, ele percebia que era hora de voltar.
Corria para casa descalço, molhado, salgado, relembrando a potência daquele mar imenso a ferver em seus ouvidos e lambendo o antebraço para sentir o gosto da pele recém-saída do oceano, tostada pelo sol. Juntamente com o êxtase de passar todo o dia sendo socado pelo mar até ficar tonto, aquele gosto, aquele cheiro o inebriavam de tal modo que por um triz ele não cravava os dentes na sua carne para arrancar um pedaço e saborear sua própria existência carnal."
Philip Roth - "Homem Comum"(2006)
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