Exposição X Imposição

10 de fevereiro de 2010




A notícia sobre o fechamento do Surf Movies, veiculada em primeira mão no Sur4ever reacende a delicada e eterna polêmica sobre a questão dos direitos autorais das obras artísticas – neste caso, filmes e trilhas sonoras de surf – e sobre até que ponto o combate a pirataria é eficiente e produtivo para os próprios realizadores.



Já debati este tema por aqui diversas vezes e as respostas nunca são definitivas e variam de caso a caso, fomentando opiniões antagônicas, mas com argumentos consistentes em ambas as frentes. De início, é interessante observar que no mesmo dia em que o Surf Movies saiu do ar, a Quicksilver disponibilizou de graça no Surfline o download de sua mais recente produção, o breve e alucinante Cypher.



Quem leu a recente entrevista deste blog com o Junior Faria, ficou sabendo que o seu filme Eu Mesmo Faria será lançado encartado da revista Hardcore e posteriormente poderá ser baixado de graça, provavelmente no site da Hang Loose, patrocinadora do atleta - que inclusive criou uma divulgação interativa do trailer, unindo mídia impressa e internet. Também já citei aqui outros filmes disponibilizados gratuitamente na internet desde o seu lançamento, como as produçòes da Relentless.

E o que tudo isso significa? A meu ver, estes fatos evidenciam que na era digital em que vivemos, existem muitos caminhos de divulgação a serem explorados do que simplesmente tentar coibir a pirataria na internet - uma prática que, em muitos casos, mais ajuda do que prejudica a exposição de uma marca ou produto entre os seus consumidores.

Afinal de contas, até que ponto vale a pena produzir um filme que quase ninguém vai ver? Seja por falta de distribuição ou taxas de importação que deixam os preços muito altos, ou espaço na grande mídia, a grande maioria dos filmes de surf, principalmente aqueles mais “artísticos”, que não estão vinculados a alguma grande marca de surfwear, simplesmente não estão acessíveis aos surfistas/consumidores brasileiros.



No caso do Surf Movies, já era de se esperar que alguma grande corporação se manifestasse no intuito de tirar o site do ar por se sentir comercialmente lesada. Afinal de contas, o endereço eletrônico disponibilizava de maneira organizada e bastante informativa uma seleção valiosa de filmes e música relacionadas ao surf – com direito a trailers e matérias sobre os produtos.

O mesmo Sur4ver em um post mais antigo celebrava um ano de existência do Surf Movies, revelando uma média diária de 3 mil visitas - quem tem um blog sabe muito bem o que representa um numero como esse! Num contraponto, o sistema de dowloads gratuitos deste vasto acervo de filmes de surf, inviabilizava comercialmente iniciativas legalizadas e interessantes como a do excelente The Surf Network, também já abordadas neste blog.



Quem teve a oportunidade de acompanhar as últimas semanas do Surf Movies presenciou o anseio dos milhares de internautas ávidos por novidades que imploravam ao editor do blog para que interrompesse as suas férias e disponibilizasse o ainda inédito The Drifter. Desejo atendido, a divulgação antecipada do filme, antes mesmo de seu lançamento oficial por aqui, acabou determinando o fim do blog sob justificadas ameaças de processo criminal por parte dos produtores. E agora, será que alguém vai deixar de consumir produtos do patrocinador do Rob Machado em sinal de protesto por que eles acabaram com o Surf Movies?

Não quero entrar aqui no mérito legal sobre como o administrador do Surf Movies conseguia acesso e meios de reprodução do material publicado, ou se ele conseguia algum lucro direto ou indireto com a prática. O que pretendo neste texto é expor (e defender) a liberdade de cada um em relação aos direitos autorais sobre suas prórpias criações e nesse contexto, o sistema Creative Commons me parece a ferramenta mais realista e flexível em relação à permissão de uso que cada um confere à sua obra.



Em termos de marketing e publicidade, os lucros de uma marca de surfwear não sofrerão grandes abalos caso o filme que ela produziu para divulgar sua marca e atletas caia na rede antes mesmo de ser comercializado. Mesmo porque, não existem muitos lugares onde se possa comprar filmes de surf no Brasil! Contudo, não há como refutar o argumento daqueles que alegam que este tipo de pirataria inviabiliza a venda do filme para exibição na TV.

Na parte da produção do conteúdo propriamente dita, de maneira geral, os profissionais envolvidos na criação – diretores, produtores, cinegrafistas, designers, músicos e assistentes – recebem um valor fixo do patrocinador do projeto pelos seus serviços prestados, ou seja, não ganham qualquer valor adicional sobre as vendas do filme. Assim, o filme já sai do forno pago pelo patrocinador que poderá usufruir dele como produto de marketing da maneira que melhor lhe convir.

E afinal de contas, quanta mídia positiva para a empresa patrocinadora o filme The Drifter já havia gerado, muito antes de seu lançamento, em trailers no YouTube e em tantas outras referências? Embora existam eficientes sistemas de pesquisa para verificar estas questões, alguns destes valores são simplesmente intangíveis.



E no caso do produtor independente? Acredito que este encontre no Creative Commons o suporte legal necessário para autorizar a reprodução e uso de sua obra da maneira que lhe for mais atraente, num cenário onde muitas vezes é preferível abrir mão de um possível lucro financeiro imediato em troca de uma maior divulgação que lhe permita “fazer o nome”, novos contatos e ser contratado para trabalhos remunerados no futuro.

Tratamos aqui da questão dos filmes, mas ela se estende a toda manifestação artística e intelectual - na música a questão é ainda mais complicada quando se começa a julgar direitos autorais sobre usos de samples e pequenos fragmentos de uma música capazes de dar origem a tantas novas criações - O Esquema publicou um link de um filme muito interessante sobre o tema.

Costumo ser muito criterioso na divulgação de fotografias de terceiros, no entendimento de que o uso não-comercial e com caráter de divulgação via blogs - sempre linkando ao trabalho original - é uma das práticas de comunicação mais interessantes e eficientes nos dias de hoje na internet - mas que infelizmente está atrelada a critérios subjetivos. Assim, o assunto jamais se esgota, mas encerro este post dizendo que o conteúdo literal deste texto está disponível para reprodução, desde que citando o autor.

Já a foto de abertura deste post é um bom exemplo do uso de uma imagem sob licença Creative Commons:

5 comentários:

Surf4ever disse...

Muito bem colocado, concordo com teu raciocínio.
É um tema bem complexo e de difícil consenso.

Eu via o Surf Movies como uma espécie de "Robin Hood" dos filmes de surf. Mesmo que por meios duvidosos, ele levava um vasto material até uma multidão que talvez nunca na vida iria ter acesso àquilo tudo.

O pior é que ele acabou pagando o pato, pois o "The Drifter" anda vagando pela web em outros links. Certamente o Rob Machado não iria estressar com esse rolo todo...

Abs,
Gustavo

P.S - pior é que logo naquele post lá eu não sei o nome do autor daquela foto irada...

Felipe Siebert disse...

Como diria o outro... é uma faca de dois legumes... hehe

ao mesmo tempo que eu quero ter todos filmes possiveis e usufruir de tudo isso sem gastar nada, o cara lá que se matou filmando e editando também quer ganhar pelo menos o dele...

Filme de marca é uma coisa, filme independente, de cineastas, é outra...

Bom, eu to adquirido os meus videos originais mesmo ja tendo baixado alguns pela internet... Primeiro porque, como colecinador destes filmes, prefiro ter o original, com encarte, bonus, etc... Segundo, de alguma forma estou apoiando o trabalho destes filmmakers.

Concordo que é mais fácil fazer o download de um filme doque pegar o cartao de credito e comprar os filmes, enviar para casa de algum camarada nos EUA para ele trazer pra ti... função desgraçada, mas pra mim vale...

Elguma disse...

È realmente o surfmovies foi meio que um "Robin hood" varios filmes que eu sabia que era improvavel eu conseguir,não por falta de dinheiro e sim por indisponibilidade no mercado,tava lá postado,foi bom enquanto durou,infelizmente os cara só querem o lucro...como a gente somos uma tribo unida,o surfmovies deixou suas raizes já,milhares de usuarios no mundo todo tem os filmes que postavam lá,o bem vence o mal...vamos surfa galera,na paz,e valew ao grande SURFMOVIES.

fish disse...

Coé Bura, nem me consultou!

O que as marcas deviam em pensar é num modelo de negócio aberto, que amplie a visibilidade da sua marca via a liberação do acesso ao conteúdo.

Quanto mais gente assistir ao filme, mas gente vai ver o atleta vestindo a marca patrocinadora, o hotel ou barco que eles alugaram, até a cia aérea que eles utilizaram.

Inserir isso de forma sutil nos filmes e liberar o acesso ao conteúdo é uma estratégia de negócios recente mas que vem dando resultados.

Sem falar no caso do Radiohead que disponibilizou todo o CD dizendo que o consumidor pagaria quanto quisesse. 40% pagou 10 dólares, em seguida o CD foi lançado nas lojas, e foi recorde de vendas...

Sem falar que o lucro das grandes marcas com os filmes, acredito eu, ser baixo em relação a venda de roupas e acessórios, ou seja, os filmes assim como o patrocínio de atletas são de certa forma a estratégia de marketing deles, sendo assim, nada mais inteligente que disponibilizar o conteúdo. Até porque, de uma forma ou de outra, tudo cai na internet, querendo ou não. Nesse contexto, é muito mais inteligente o próprio produtor do filme desenvolver esse trabalho, atraindo mais visitantes para o seu site e melhorando sua imagem junto a seu público (por ser generoso).

Passei anos com a abordagem do acesso ao conteúdo e tal e nunca conseguia convencer o povo, quando passei a estudar que além de tudo, disponibilizar o conteúdo nada mais que uma ferramenta de marketing poderosa.

Abraço e parabéns aixxxx
Fish

Anônimo disse...

eu sei q não é tão simples .. mas num era só retirar o link do "the drifter" ? tomara q o blog volte .. eu frequentava ele todos os dias !

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